Mobilidade

Aplicativos de motoristas aumentam lucro e valorizam locadoras na Bolsa

Visto como uma ameaça a princípio, o avanço do transporte por aplicativos no Brasil abriu…

Visto como uma ameaça a princípio, o avanço do transporte por aplicativos no Brasil abriu um novo segmento para locadoras de veículos e ajudou a engordar o balanço dessas empresas, que têm apresentado ainda bons desempenhos na Bolsa.

O lucro líquido da Localiza, a maior do mercado, saltou 17% em 2018, para R$ 659 milhões, informou a companhia na semana passada, dando largada à temporada de divulgação de resultados do setor.

Em 2018, suas ações avançaram 35%. Os papéis dos pares Unidas e Movida valorizaram 96% e 22%, respectivamente. Como comparação, o Ibovespa, índice que reúne as ações mais negociadas, subiu 15%.

As locadoras não divulgam a participação dos motoristas por aplicativos em suas operações, mas a equipe da Mapfre Investimentos estima que algo próximo a 20% do segmento de aluguel de carros esteja direcionado para esse cliente.

A Localiza criou, no ano passado, um canal de atendimento exclusivo para motoristas parceiros, o Localiza Driver. Ele permite que o valor do aluguel do veículo seja descontado diretamente dos ganhos obtidos com as corridas.

“Estudamos muito a forma como eles pensam e entendemos que precisamos oferecer planos para cada necessidade”, diz Bruno Lasansky, diretor da divisão de aluguel de carros da Localiza.

Na Movida, o segmento fica em um dígito da receita, de 7% a 9%, de acordo com Renato Franklin, presidente-executivo da locadora.

“O setor de locação como um todo tem apresentado fundamentos muito sólidos, e os aplicativos ajudam, sem dúvida. São 20 pessoas por dia entrando em um carro e descobrindo com o motorista como aluga, quanto custa”, afirma.

A locadora também oferece condições especiais para esses profissionais, como a contratação de quilometragens mais altas, e tem parceria com o Lady Driver, aplicativo para mulheres.

“Os motoristas de aplicativos são um segmento sobre o qual as locadoras começaram a falar mais recentemente, embora eles já tenham contribuído para um crescimento relevante e exista potencial grande nesse canal”, diz Bruna Pezzin, analista da XP.

“O Brasil é um dos principais mercados da Uber, hoje e nem todos esses motoristas alugam carro ainda.”

A companhia americana, a principal para aplicativos do tipo, tem cerca de 3 milhões de motoristas cadastrados no mundo –mais de 600 mil no Brasil, onde opera desde 2014.

Os aplicativos de motoristas ganharam impulso na esteira da recessão, que empurrou profissionais registrados para o trabalho autônomo.

“Quando a Uber começou a tomar corpo, pensou-se que poderia ser um risco para as locadoras, porque as pessoas deixariam de alugar carro para usar o aplicativo”, diz Pedro Bruno, analista do Santander.

“Depois, percebeu-se que seria o contrário: a empresa traria oportunidades, já que os motoristas alugariam.”

Há sete meses, Edvaldo das Neves, 55, alugou um Chevrolet Cobalt da Movida para trabalhar via Uber. Ele está cadastrado na plataforma como motorista há um ano e meio e fez 4.500 corridas. Antes, já havia alugado um Prisma.

“Sempre trabalhei em multinacionais, na parte comercial, mas depois dos 40 anos você fica fora do perfil. Tenho um bom currículo, mas não consegui me recolocar”, conta.

Segundo ele, o aluguel diário do carro sai por R$ 50 e a sua meta é faturar com corridas R$ 250 por dia. “Como Uber, você roda muito, acabaria depreciando o carro rápido.”

Apesar dos investimentos, analistas apontam que as locadoras buscam um crescimento sustentável no segmento. “Muitos motoristas dividem o aluguel do veículo. O carro roda e nunca para. As empresas alugam, mas ficam de olho no limite de quilometragem. Muitas vezes, oferecem a troca do veículo pelo mesmo preço”, diz Pedro Bourroul, analista da Mapfre.

Além dos motoristas em si, os apps trouxeram uma demanda paralela. “As pessoas trocaram o carro pelo app no dia a dia, mas, quando têm de fazer um deslocamento maior, alugam um veículo”, diz Paulo Miguel Junior, presidente do conselho nacional da Abla (associação das locadoras).

Ele afirma que o setor foi resiliente à crise, em parte, porque empresas de outras áreas precisaram cortas gastos e terceirizaram suas frotas –outro segmento em que as locadoras têm crescido.

Ganho de escala, consolidação da concorrência –a Locamerica comprou a Unidas na virada para 2018 e assumiu a marca– e queda nos preços de locação também ajudam a explicar o impulso no setor.

“Alugar um carro está, em termos nominais, 15% mais barato que há dez anos. A única forma de o serviço ser rentável é ganhando escala”, diz o diretor de aluguel de veículos da Unidas, Carlos Sarquis.

O bom desempenho das locadoras gera efeito também nas montadoras, que viram as vendas diretas subir, embora o segmento esprema margens.
Em janeiro de 2018, as vendas diretas representavam 27% dos emplacamentos de automóveis leves, segundo a Fenabrave (representante das distribuidoras de veículos). Em dezembro, já eram 37%.

“A capacidade ociosa das montadoras ainda está alta. Enxergamos, no longo prazo, a possibilidade de continuar trabalhando próximo delas”, diz Franklin, da Movida.

A  Abla espera mais um ano bom em 2019, principalmente se o reaquecimento da economia se confirmar, “porque o setor ainda é pequeno”, diz Miguel. Em 2017, mais recente dado da associação, as locadoras reuniam 709 mil carros.

“Os apps são uma via de crescimento importante agora, mas, de qualquer forma, todos os segmentos têm potencial com a eventual volta da economia”, diz Pezzin, da XP.