Cinema

Crítica: Soul (2020) – Especial Pixar

QUAL É O SENTIDO DA VIDA? Qual é o sentido da vida? Uma pergunta que…

Soul - Disney+ - Pixar

QUAL É O SENTIDO DA VIDA?

Qual é o sentido da vida? Uma pergunta que há muitos e muitos anos foi assunto para filósofos, debates e indagações acerca do nosso objetivo aqui na Terra. Mas uma pergunta que abre tanta margem para interpretações e meditações resulta em algo tão simples, pueril, mas tão óbvio que a Pixar responde com maestria em sua mais nova obra-prima do cinema. Qual é o sentido da vida? Simples. É viver. Não é se tornar obcecado por um propósito auto imposto por nós mesmos, mas é, simplesmente: viver. Aproveitar cada momento. Cada segundo. Cada nuance da vida que nos é apresentada. Seja o saborear de uma pizza. O caminhar no parque. O chorar por um amor que não deu certo. Ou aproveitar os segundos ao lado de um amor que deu certo. É o acordar pela manhã e perceber que tem vida e mais um dia cheio de detalhes e minúcias que fazem toda a diferença em nosso aproveitamento disto que chamamos de vida.

É comum nós seres humanos buscarmos o sucesso. Para muitos o sucesso é quando se chega ao alto do pódio e se tem muito dinheiro para viajar e gastar com o que há de mais caro e luxuoso. Para muitos, ter sucesso é viver cercado de mulheres ou homens. Luxo. Prazer. É ser renomado na profissão e sempre ter mais. E mais. E mais.

A mensagem de “Soul” é justamente o contrário. É mostrar que ter sucesso, ser bem sucedido, é aproveitar a jornada. Desde o começo. É abrir os olhos e perceber o mundo ao nosso redor. As pessoas. As possibilidades. Os detalhes da vida desde o momento em que acordamos até o dormir. São estas pequenas realizações que nos preenche e nos proporciona o verdadeiro prazer. É uma conversa marota com um amigo querido. É ler um livro. Ver um filme. É ficar deitado no chão frio de casa em um dia quente e sentir o gelado do piso. É escrever um texto. Ler um texto. É observar que durante as 24 horas do dia existem tantas situações, e coisas, a serem percebidas, e apreciadas, que, infelizmente, estamos perdendo o sentido de viver. Somos apressados com tudo e todos. Não agradecemos por estarmos vivos. Não aproveitamos quem está ao nosso lado. Só pensamos em trabalho. Dinheiro. Sexo. Redes sociais. E esquecemos que cada uma destas coisas são válidas, e precisam ser apreciadas, mas nunca tornar-se obsessão. Com nada, na verdade. Elas precisam trabalhar em favor do todo e nunca tornar-se o nosso todo.

Aparentemente, perdi três parágrafos sem falar do filme “Soul”. De sua narrativa genial, da trilha sonora perfeita, da criatividade com que a Pixar mais uma vez nos leva a um mundo totalmente novo para falar justamente do nosso e, claro, da direção soberba de Pete Docter (diretor responsável por outras obras-primas como “Monstros S.A”, “Up – Altas Aventuras” “Divertida Mente”). Mas não perdi três parágrafos. Cada palavra mencionada anteriormente neste texto é justamente sobre o que faz de “Soul” um dos filmes mais essenciais do cinema, principalmente para o mundo atual. Tudo dito é o cerne do que é apresentado em cada frame das 1h40 de duração.

SOBRE O DIRETOR PETE DOCTER

Pete Docter é um diretor pouco lembrado como um dos pioneiros da Pixar. Sempre falamos de John Lasseter, Ed Catmull e Steve Jobs como os fundadores da empresa. E, de fato, foram. Mas Docter esteve presente desde o nascimento da Pixar. Trabalhou no roteiro e produção do primeiro “Toy Story” e esteve ao lado de Lasseter na concepção dos curtas-metragens anteriores que ajudaram a fomentar o pioneirismo das animações computadorizadas. Atualmente, Docter é o presidente da Pixar (assumiu após a demissão de Lasseter, que foi tirado pela Disney devido às acusações de assédio) e responsável por alguns dos melhores filmes do estúdio. Um diretor consistente na narrativa cujo roteiro é a prioridade principal. Uma carreira de dar inveja e que merece, sim, ser reconhecida mais vezes.

POR QUE “SOUL” É O MELHOR FILME DA PIXAR?

A Pixar sempre foi considerada a grande referência das animações computadorizadas não por ter começado a moda (com o sucesso de “Toy Story” em 1995 – o primeiro longa-metragem todo feito em computador), mas sim, pela excelência dos roteiros. Recomendo o livro “Criatividade S.A” escrito por um dos fundadores do estúdio, Ed Catmull, e onde ele descreve os bastidores da empresa, e como os diretores priorizavam o roteiro acima de tudo. A técnica nunca deve suplantar a história. O roteiro é o mais importante. Com este pensamento, a Pixar criou uma série de clássicos seguidos, filmes que marcaram a vida de muita gente e continuam fazendo.

E cada filme criado pelo estúdio, cada história inspiradora, como:

brinquedos que se entregam ao propósito de agradar ao dono mas durante a jornada dos quatro filmes vão descobrir muito mais sobre si mesmos;

ou de formigas que vivem em função do predador até verem que juntas são muito mais fortes;

do peixe-palhaço que cruza o oceano atrás do filho perdido;

de monstros que encontram em si força muito maior que o medo para trazer vida ao seu mundo;

uma família de heróis que precisa olhar para si e estarem juntas para vencerem as adversidades;

um carro egocêntrico que precisa viver numa cidadezinha interiorana para aprender que menos é mais;

um robô que vive numa Terra devastada catando lixo e cuja vida muda após se apaixonar por uma robô;

um rato cozinheiro que enfrenta o improvável para se tornar um chef de cozinha;

um velho e um garotinho precisam sair da zona de conforto e viver uma grande aventura com uma casa voadora para apreciarem o melhor da vida;

uma princesa que precisa parar de pensar em si para entender o valor e amor da mãe;

certas emoções que precisam entender as suas próprias emoções para ajudar sua dona humana;

um dinossauro precisou ficar sozinho numa Terra gigante e pré-histórica para amadurecer, encontrar força interior e crescer;

ou um garotinho no México que ensina a família o valor do perdão e da música;

ou dois irmãos elfos que vivem uma aventura para entenderem a importância de valorizar quem está perto, e não quem já partiu,

e agora, nós temos…

“SOUL”, que é a culminação de todos estes temas e reflexões sobre a vida. O filme de Pete Docter é o “Vingadores: Ultimato” da Pixar. O filme que reflete, resume e nos ensina tudo sobre aquilo que o cinema fala: a vida. Seja representando mundos fantásticos ou reais, o cinema é a janela para entender um pouco de nós, de como vivemos, de nossas emoções.

“Soul”, como já diz o nome do filme “Alma”, é o testamento de tudo isto. Um exemplar poderoso da importância de entender que a missão que escolhemos aqui na Terra não é o nosso propósito de vida. Mas sim, viver. Viver cada momento, cada nuance e detalhe como se não fosse existir o amanhã.

Se o Oscar realmente quiser fazer história como ano passado quando premiaram o primeiro filme estrangeiro como Melhor Filme (“Parasita”), “Soul” é a obra perfeita para ser a primeira animação a ganhar o principal e mais importante prêmio da noite.

“Soul” é o melhor filme de 2020. É o melhor filme da Pixar. E é, inquestionavelmente, uma obra-prima absoluta.

Soul/EUA – 2020

Dirigido por: Pete Docter

Vozes no original: Jamie Foxx, Tina Fey, Grahan Norton, Questlove…

Sinopse: Em Soul, duas perguntas se destacam: Você já se perguntou de onde vêm sua paixão, seus sonhos e seus interesses? O que é que faz de você… Você? A Pixar Animation Studios nos leva a uma jornada pelas ruas da cidade de Nova York e aos reinos cósmicos para descobrir respostas às perguntas mais importantes da vida.